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Liderança critica documentário que fala da participação evangélica na política



Cena do documentário "Apocalipse dos Trópicos": O pastor Silas Malafaia é a figuraO lançamento do filme “Apocalipse nos Trópicos”, dirigido por Petra Costa, reacendeu o embate entre lideranças evangélicas e setores progressistas da política brasileira. 

Exibido no Festival de Veneza de 2024 e disponível na Netflix, o longa analisa o papel da fé no avanço da extrema-direita no país, destacando a ascensão do conservadorismo evangélico e suas conexões com o bolsonarismo.O pastor Silas Malafaia, figura central na narrativa do longa, reagiu aos gritos ao participar de uma sessão do filme em um cinema. Pastor Gustavo Knauer, cientista político e dirigente da ADVEC Alphaville, também reagiu.
“Precisa ficar bem claro uma coisa. Não é um documentário, é uma peça de propaganda da esquerda que visa atacar a crescente participação dos evangélicos no debate público e na política. Esse é o ponto. É aqui que é o jogo”, afirmou.
Para ele, o crescimento vertiginoso dos evangélicos no Brasil e sua força eleitoral causam incômodo. “Hoje, o mundo evangélico decide presidentes, governadores, prefeitos. Isso assusta muito, principalmente aqueles que são adversários políticos desse segmento”.
Knauer ainda argumentou que a esquerda, por não conseguir estabelecer um vínculo significativo com o mundo evangélico, teria adotado uma estratégia de descredibilização das lideranças. “Eles não aceitam que o maior segmento social, mais engajado online, não os serve com votos. Pelo contrário, oferece uma oposição firme”.
O documentário apresenta imagens de cultos, manifestações políticas e bastidores de campanhas, envolvendo figuras como o ex-presidente Jair Bolsonaro, o atual presidente Lula e os episódios do 8 de janeiro de 2023. Para a diretora Petra Costa, a proposta surgiu da inquietação sobre como a interpretação bíblica, especialmente a apocalíptica, pode moldar visões políticas.

“A ideia de ‘apocalipse’ passou a ser chave para compreender o discurso adotado por líderes que enxergam o caos como necessário para a chegada de uma nova ordem”, declarou à Folha de S.Paulo.

Lenildo Medeiros, pastor batista e jornalista, também questionou a abordagem do filme. “O documentário termina falando de paz e amor, mas sua maneira de tratar os evangélicos é violentamente baseada em generalizações”, avaliou.

Ele reconheceu a qualidade técnica da produção, mas afirmou que isso “não a torna menos panfletária, tendenciosa e propaganda da esquerda, com aquele toque maniqueísta de sempre”. Em sua leitura, a narrativa coloca “Bolsonaro, evangélicos, direita, conservadores e fundamentalistas como vilões, enquanto Lula, Janja e os progressistas são os mocinhos”.

Tentativa de dominação

O ponto de maior incômodo entre os críticos está na suposta tentativa de associar o movimento evangélico brasileiro ao fundamentalismo religioso e à tentativa de dominação política. Knauer foi enfático ao apontar essa leitura como distorcida. “Eles ficam criando um espantalho. Tentam associar o crescimento evangélico à ideia de que queremos substituir a Constituição pela Bíblia, como se quiséssemos um país teocrático. Isso não existe”.


Para ele, o longa está inserido em uma estratégia mais ampla. “Esse filme não é um fato isolado. Está dentro de um plano, baseado na estratégia de Gramsci e da Escola de Frankfurt, que busca influenciar cultura, imprensa e universidades para recontar a história e enfraquecer a presença evangélica na sociedade”, afirmou. “Querem nos enfiar dentro das igrejas, calar nossas vozes no debate público”.


Medeiros também vê prejuízos para o diálogo entre fé e política. “Tentar desmerecer, desacreditar, ridicularizar, zombar e desvalorizar os evangélicos só os faz crescer ainda mais”, declarou. Segundo ele, tanto a esquerda quanto a direita disputam os votos dos evangélicos, mas a primeira “não consegue por incompetência” enquanto a segunda “respeita mais a inteligência, sabedoria, capacidade de pensar e decidir que os evangélicos realmente têm”.


O pastor ainda criticou uma fala específica atribuída a Lula e Janja no documentário. “Falar de tiro no culto como se fosse uma regra comum e não uma exceção é ridículo. Isso só mobiliza mais ainda os evangélicos contra a esquerda”.

Ausência de crítica à esquerda

Knauer questionou a ausência de crítica à esquerda no filme. “Há uma tentativa de livrar tudo que pesa sobre o Lula, sobre Dilma e o PT. É uma conexão clara com a esquerda brasileira. Passam pano para tudo o que Lula fez, inclusive a prisão em três instâncias com recurso negado ao STF. É uma peça de propaganda do PT contra os cristãos”.


Apesar das críticas, o filme também encontra defensores. A jornalista Flávia Guerra, colunista do UOL, afirmou que a obra “conecta o fundamentalismo religioso a estratégias de poder que não dialogam com a democracia”.


No contexto atual, “Apocalipse nos Trópicos” chega em um momento de forte presença evangélica na política brasileira. Segundo o Censo 2022 do IBGE, os evangélicos representam 26,9% da população, cerca de 47,4 milhões de pessoas. O crescimento do grupo, somado à sua organização eleitoral e ao discurso conservador, mantém o tema da fé como peça central nas disputas políticas do país.

O documentário está disponível exclusivamente na Netflix. Não há previsão de exibição em canais abertos ou outras plataformas digitais. Para seus críticos, trata-se de uma tentativa de reescrever a história recente por meio da cultura. Para seus defensores, é um alerta sobre os riscos do avanço religioso nas estruturas de poder. Entre a denúncia e a resposta, o debate continua abert.

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